terça-feira, 17 de agosto de 2010

Direitos autorais em debate

Encontro na Capital discute proposta de mudança na lei

Uma nova controvérsia do setor cultural – a proposta lançada pelo Governo Federal para mudar a Lei de Direito Autoral brasileira – será debatida hoje em Porto Alegre. Às 17h, no Teatro Renascença, o Comitê Nacional de Cultura e Direitos Autorais (CNCDA) promove uma reunião para discutir o tema, em sessão aberta a artistas e ao público em geral.


O tema central do debate é a lei 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, que regula os direitos dos criadores de músicas, livros, filmes e obras teatrais, entre outras manifestações. Regras que têm a ver, por exemplo, com o quanto o autor de uma canção deverá receber quando sua música tocar no rádio, em uma casa noturna ou mesmo em uma academia de ginástica. No último dia 14 de junho, o Ministério da Cultura (MinC) lançou na internet um anteprojeto que estabelece mudanças em muitos artigos da lei atual – prevê, por exemplo, a punição ao pagamento a rádios e emissoras de TV para aumentar a execução de uma determinada música, prática conhecida como jabá.


Conforme o MinC, as novas regras sugeridas foram lapidadas ao longo dos últimos quatro anos e visam a atualizar a legislação e a aumentar a arrecadação de direitos autorais.


– A lei atual é um entrave para o desenvolvimento cultural do Brasil, é um entrave para a economia da cultura e não realiza o seu objetivo principal, que é o direito do autor – disse o ministro da Cultura, Juca Ferreira.


Desde que foi apresentada, a proposta vem gerando discórdia. Há pelo menos dois temas que geram resistências entre artistas e seus representantes. Um é a proposta de supervisão do MinC na arrecadação de direitos autorais – atividade hoje exercida pelo Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad). Outro é a criação do conceito de “licenças não voluntárias”, autorizações para uso de obras que o governo poderia emitir independentemente da vontade dos criadores.


O encontro de hoje deverá contar com a presença de artistas como Raul Ellwanger e Elton Saldanha. O debate segue na internet. No site www.cultura.gov.br/consultadireitoautoral, os leitores podem conhecer a proposta e apresentar sugestões – a consulta pública vai até o dia 31 deste mês, e só depois disso o governo deverá enviar o anteprojeto ao Congresso Nacional.
A questão do Ecad
Frequentemente questionado por artistas e governo, o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad) é um dos alvos da nova proposta do MinC. Segundo as normas sugeridas pelo governo, as associações ou entidades que cobram direitos autorais terão de obter previamente um registro no ministério e apresentar relatórios anuais de auditoria externa, para dar mais transparência à arrecadação.
A superintendente executiva do Ecad, Gloria Braga, defende o órgão lembrando que o escritório representa entidades como a Sociedade Brasileira de Autores, Compositores e Escritores de Música e a Associação Brasileira de Música e Arte. Segundo ela, o Ecad distribuiu R$ 318 milhões para 81,25 mil criadores de música em 2009 – valor que poderia ser ainda maior.
– Só em 2009, deixamos de arrecadar R$ 33 milhões com a inadimplência das rádios, e a proposta do governo não prevê uma punição para elas – afirma Gloria. – No mundo todo, existe um movimento de mudança no direito autoral. Com a internet, há uma necessidade quase infinita de uso de obras criativas, e há pressão econômica para que as leis facilitem o uso desse conteúdo pelas grandes corporações.



O que é a licença não-voluntária?

Um capítulo inteiro do anteprojeto trata das polêmicas autorizações de obras literárias, artísticas ou científicas, que poderiam ser assinadas pelo presidente da República “quando o autor ou titular do direito de reprodução, de forma não razoável, recusar ou criar obstáculos ao licenciamento”. Ou seja: conforme o caso, o governo poderia autorizar o uso de uma obra, mesmo contrariando a vontade do criador.

Para a Academia Brasileira de Letras, “a opção de ceder ou não seus direitos de criador deve continuar sendo prerrogativa do autor, detentor exclusivo de suas obras intelectuais”. O Comitê Nacional de Cultura e Direitos Autorais (CNCDA), que congrega entidades de áreas como música, teatro, cinema e literatura, considera “irresponsável e mentirosa” a proposta do MinC.

– A lei atual eu ajudei a escrever. Há pontos a serem aperfeiçoados. Mas não se faz lei de bate-pronto. Tem que ser muito bem pensado – diz Roberto Corrêa de Mello, presidente da Associação Brasileira de Música e Artes e do CNCDA, e também advogado e membro da diretoria da Associação Brasileira de Direito Autoral. – É um projeto totalitário, que quer tomar da iniciativa privada algo que não é do Estado.




Fonte: Zero Hora - 17/08/2010

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